Curando meu feminino

 Esse texto teria ganho um nome não tão positivo, se eu o tivesse escrito ontem à noite. Hoje é diferente porque precisamos vivenciar experiências muito significativas que inspiram a escrita e que ela seja terapêutica para outras mulheres.

 Na sexta-feira conheci a Mariana filha da Cacique Maria da Aldeia Itaverá e a Sabrina que me deu um presente lindo no braço direito (esse que vocês estão vendo na imagem) e no sábado que fui com a professora e amiga Gi no Museu das Culturas Indígenas onde conheci um pouco da cultura de algumas aldeias, experiências inspiradoras que eu resolvi trazer para este texto.

"Pensando por esse caminho, você pode me perguntar onde eu comecei a me curar e eu vou te contar. Não sei se o começo é realmente por estes dias, mas eles fazem parte do processo em que a gente vai se dando conta, tomando doses de consciência e refletindo sobre como escrever algo tão significativo para outras mulheres que possam estar passando por situações tão delicadas como essas que farei o possível em contar sem expor pessoas e fatos.

A vida começa quando alguém decide o que fazer com você e por você, gera, te apresenta à vida e define como vai cuidar e mesmo sem saber se tudo que faz por você é o melhor que pode fazer; mas nesse ponto de discussões internas, sua vida está nesse planeta. Nesse processo de começo de vida, nem todos os planos são executados como programado e quando as coisas dão errado, você adquire marcas que as vezes ficam adormecidas no seu inconsciente, cicatrizes marcadas na pele e assim por diante, mas tem episódios que acontecem com você quando não se espera e não depende da sua vontade, da sua família, mas que a faz seguir à diante mesmo sem saber o que vai fazer e como agir dali para frente, num futuro marcado para sempre.

A vida segue um dia de cada vez como sempre seguirá com você bem ou mal, no caminho, de pé mesmo que destruída por dentro por escolha de alguém que se deu o direito de tirar a sua escolha de vida. Esses dias podem ter um dia ensolarado, mas em você o dia está nublado, no cinza mais intenso que nunca tenha visto.

E, você? Tentando dar um passo de cada vez, em dias cinzentos e ensolarados, tentando tomar banhos reconfortantes, tentando recomeçar todo dia um pouquinho.

Um certo dia, você conhece alguém interessante e confia seu segredo, se sente acolhida e segura, sem saber que está entrando numa relação que não depende exclusivamente de si mesma, mas confia da mesma forma em que os dias vão passando e você se dá conta que sente-se patinando sem sair do lugar, percebe que tem algo de errado, mas não consegue tomar decisões que te darão novos rumos para sua vida. Percebe à distância que algo de muito errado está acontecendo, mas não consegue enxergar nada à sua volta porque seu amor próprio está arruinado, sua autoestima foi na enxurrada. Então consegue tomar uma decisão: se afasta do olho do furacão que é a sua vida e vai viajar. Nesta viagem para ver o mar, conhece pessoas que conversam com você e te contam sobre suas vidas fazendo a entender que o que você pensava estar errado na sua vida, está MUITO errado em acontecer. Aproveita a viagem, passa horas olhando para o mar e quando o dia da volta para casa chega, sabe que terá que ser forte e enfrentar a decisão difícil que mudará a rota da viagem da vida.

Enquanto você decidia o que fazer com a vida, fez as escolhas que acredita serem as melhores e fez o que podia ter feito de melhor para aqueles momentos, porém agora o melhor a ser feito era tomar as rédeas da própria vida e decididamente a partir desta escolha começa a determinar suas escolhas, porque mal sabe que é o ponto de partida para um novo começo.

Uma nova trajetória de vida começa, tomando a decisão de recomeçar mais uma vez, mesmo que algumas peças do quebra-cabeça não fazem sentido algum para você. Sempre é tempo de recomeçar, já que todos os dias você começa um novo dia. 

Daquela experiência, um ato agressivo e criminoso, uma voz feminina silenciada, um aborto espontâneo inicial, nem mesmo sabendo que estava grávida. Anos depois uma curetagem e uma gravidez desejada, numa relação que parecia saudável e que tornou-se abusiva emocionalmente, financeiramente e psicologicamente fora dos "padrões" do que se espera por saudável e o fim de um relacionamento por escolha daquela mulher ferida.

Lembrou-se de que além de viver aquela experiência agressiva, sofreu um estupro coletivo durante um exame numa clínica médica, onde a suas recordações foram o médico que brigava com ela, o rapaz que entrava na sala e a dor que sentira no abdómen quando voltava para casa.

Os anos seguintes foram de busca por seu feminino, relacionando-se com homens que conhecia nos aplicativos de relacionamentos com encontros bons e ruins, conhecendo a verdadeira identidade escondida por melhores fotos de anos que já se passaram a algum tempo, no masculino machucado e sobrevivente e nas escolhas de ferir mulheres inconscientemente. Em um desses encontros ruins, foi inesperadamente, surpreendida por algo que não desejava. Adquiriu HPV porque teve mais uma vez sua vontade não respeitada e silenciada mais uma vez. Naquele ano, foi ao ginecologista e fez todos os exames de rotina sem nenhuma novidade, até que em outro exame com outro especialista, foi diagnosticado a doença.

O que aconteceu com ela? Se desesperou, adoeceu, viveu seus momentos, vivenciou experiências, continuou caminhando, mas o diagnóstico a tomou pelo medo e pela vergonha de procurar o médico e entregar o exame. Foram meses de angústia e sofrimento, até que certa noite, assistindo o reels do médico que ela conhecia e que por ele tinha uma relação de confiança, o ouviu falando quais os procedimentos que se faz no tratamento para essa doença e isso a tranquilizou. Ela entendeu que o processo de curar o seu feminino estava começando. Não pelo fato de estar com uma DST (doença sexualmente transmissível), mas percebeu que havia entendido todo o processo que a acometeu: os estupros, o aborto e o HPV.

Desde então, acalmou seu coração, vem encontrando a paz, está enfrentando as possibilidades do tratamento e principalmente, hoje essa mulher que antes fora silenciada, toma decisões, determina o que quer e quem quer consigo,  faz terapia e vem entendendo que o que aconteceu NÃO FOI CULPA SUA.

O medo ainda existe e com medo ela segue. Como ela mesmo disse quando me procurou, "depois que assisti sua live de sexta @merikolduarte e de sábado no Instagram @zaira_fabre, com medo eu vou seguir a vida até onde Deus me Permitir e eu escolho o que eu quero alcançar. Hoje me permito imaginar estar em outra relação, mas quero me fortalecer para permanecer até onde for recíproco".

 Identidade preservada.

O objetivo das lives e dos textos é justamente inspirar e empoderar outras mulheres que sofrem abusos e que não se percebem nas relações abusivas. 

A imagem da publicação é o desenho que eu ganhei da Sabrina Indígena da Aldeia Itaverá localizada no Pico do Jaraguá. Ela representa a jiboia e significa o animal forte da floresta que é determinado.

Te deixo uma pergunta e excelentes reflexões: o que você determina para si mesm@?

TEXTO AUTORAL A PARTIR DE UMA HISTÓRIA REAL, VINDA DE UM MOMENTO INSPIRADOR E REFLEXIVO "Quem somos nós MULHERES DIVERS@S?"





Acervo Pessoal
Zaira K. Fabre

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