Mudança

Quando falamos em mudança para uma amiga, ela pode pensar que você está se mudando de residência. Se abrir uma pesquisa na internet com a palavra mudança, logo aparecem diversas possibilidades de empresas para fazer sua mudança com segurança, que não seria desprezível ou sem sentido no caso de uma mudança de endereço. Mas hoje quero compartilhar com você, leitor, uma reflexão acerca da palavra mudança, ampliando o conceito para outras áreas e outras possibilidades.

Pense nas diversas pessoas que você conhece, de diferentes realidades socioeconômica e de idades, mas não foque nas residências e sim no que é mais essencial; como cada uma enfrenta os desafios da vida cotidiana. Lógico que não sabemos à fundo como cada uma dessas pessoas lida com as questões mais subjetivas, mas podemos de certa forma, analisar mesmo pelo senso comum para quem não é da área da psicologia, como eu que observo pelo olhar da ciência.

Podemos avaliar e analisar como as pessoas interagem com sua casa, com seus pertences ou seja, como ela organiza a casa e convive no ambiente domiciliar. Com esse olhar podemos nos dar conta, com mais propriedade como essas pessoas convivem consigo mesmas.

Vou te dar um exemplo, conhecia uma pessoa por intermédio de uma amiga de anos. Essa senhora morava numa casa com o seu esposo. Digo moravam porque tanto ela quanto o esposo faleceram a algum tempo. Residiam numa casa pequena, construída no meio do terreno razoavelmente grande, uma casa antiga, térrea com uma varanda pequena por onde entravam para a sala por onde recebiam suas visitas. Particularmente, eu nunca entrei na casa porque éramos conhecidas, mas sempre passava na frente da casa deles. Quando eu era mais nova e eles também, a casa era mais cuidada, pintura regularmente e poda com a vegetação do terreno gramado e arbustos por todo o portão, do lado interno do terreno que formava uma cerca viva verde e florida, mas conforme os anos foram passando todos esses cuidados foram deixados de lado, tanto a pintura, quanto a poda. Mas tinha algo muito peculiar que me chamava a atenção, que eram os pacotes pretos colocados na varanda da entrada de sala.

Eu pensava no conteúdo daqueles sacos pretos e porque armazenados naquele lugar, fora a vegetação que cobria todo o espaço da casa, do lado de fora e a pintura velha e ressecada dando um ar desbotado e mal cuidado, até o dia que soube do falecimento do casal.

Cada vez que eu passava na casa da minha amiga, que mora na mesma rua dessa outra casa, podia ver as mudanças na residência, mudanças sucessivas e intercaladas entre limpezas e organização. Certa tarde, depois do trabalho, passando na frente da casa, vi um jovem rapaz, sentado numa cadeira na mesma varanda, prostrado na frente de um dos sacos pretos, picando papéis, folhando e separando livros, talvez para doar ou jogar fora.

Muitas pessoas passavam na frente desta casa e perguntavam aos conhecidos se a casa estava habitada, porque viam muito lixo no quintal e os famosos sacos pretos. Quando o casal morreu e o filho veio limpar a fim de desocupar a casa, ele disse que deixou os pais viverem como quisessem. Ele se referia ao apego e ao acúmulo de objetos sem necessidade de uso que tanto a mãe quanto o pai tinham quando vivos.

Trouxe essa história para vocês porque não é um fato isolado, existem muitos outros casais de todas as idades e pessoas que moram sozinhas, acumuladoras. E o fato de terem apego e amontoar "lixo" e objetos desnecessários dentro e fora de casa, significa apenas a ponta do iceberg. O fato de ser casadas ou solteiras, morarem com alguém ou sozinhas não caracteriza o problema, mas os sentimentos e a forma como lidam com os desafios do cotidiano sim porque o problema está em cada uma dessas pessoas em algumas vezes, não vivenciaram o luto por exemplo, como lidam com os afetos e os apegos, como enfrentam ou não as questões do dia-a-dia, não enxergam como desafios. 

Lembra dos desenhos que os personagens varriam o lixo para baixo do tapete? Então, os acumuladores de lembranças se apegam aos objetos como forma de não olhar para suas dores, sem aceitar suas perdas, da mesma forma que não aceitam ajuda de profissionais capacitados para contribuir com as pessoas em seus processos de cura. É sobre essa mudança que quero que você faça essa reflexão e se observe no mundo como lida com seus desafios do cotidiano e como é sua relação com sua casa.

Então fica a minha pergunta para você, "como você lida com os desafios do cotidiano?"

Zaira K. Fabre




Imagem criada no canva.com 

https://www.canva.com/join/ping-taco-artes

Texto: autoral


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