São Paulo, 15 de outubro ou todo dia?


Desde o primeiro ano na escola somos recebidos por professores (as), por educadores de maneira geral. Saímos de nossas casas, primeiro núcleo social, e vamos a escola socializar com pessoas diferentes de nós. Minha primeira professora foi a Cecilinha, carinhosamente falando, no maternal quando entrei com meus 2 anos e meio. Como ia imaginar que nesta turma conheceria minhas amigas de até os tempos de hoje. Quatro inseparáveis amigas, eu, a Luciana M., a Gisela F. e a Ângela Q. Por muitos anos nos falamos e naturalmente a vida nos separa para que tomamos conta da própria vida. O tempo passou para todas nós, amigas de coração, mas fazemos parte uma da vida da outra, assim como o provérbio "passamos na vida do outro deixando um pouco de nós e levando um pouco do outro". 

No primeiro ano do ensino fundamental, minha professora foi a Neusa, enérgica na medida certa num tempo que tínhamos medo de tirar nossas dúvidas, vergonha de perguntar o que não devíamos, levar bronca da professora e risos dos colegas. Deste ano em seguida, me lembro da professora do 4º ano, a Hidely que trabalha a mais de quarenta anos no mesmo colégio. Nesses tempos eu não era a melhor aluna e nem me esforçava para ser porque não via propósito em tudo aquilo. Tinha outros sentimentos dentro de mim, via injustiças, comportamentos inadequados de segregação, sentia a injustiça na pele branca e as diferenças de classes sociais eram estampadas na cara, enquanto eu calçava um tênis roxo comprado numa liquidação e viajava para Curitiba visitar meus avós, meus colegas iam para a Europa em todas férias sem ao menos estudar geografia pois diziam que eu só viajava para o interior.

E falando em geografia, a professora que lecionava essa matéria, filha da professora Neusa do primeiro ano, é minha vizinha e tornou-se empreendedora com uma loja de bolos e massas.

Dos meus professores que me lembro com carinho Viriato se não me engano era professor de língua portuguesa, Raphael e João Baptista, professores na psicologia. O professor Raphael nos acompanhava nas visitas aos Hospitais Psiquiátricos que eu não gostava de ir, mas ele dizia " segura no meu braço e vamos lá ver aquele interno", eu tinha pavor daquele lugar horrível. Raphael nos deixou cedo! O João Baptista foi professor de antropologia. Fiquei sabendo que ele faleceu por conta de uma reunião com o Emílio Figueira pessoa com deficiência que participou da reunião da U.E. com a professora Lucélia, falando sobre educação inclusiva que aliás faremos juntas uma live no Instagram sobre o assunto. Através de um dos trabalhos do Emílio, vi a foto do professor João que nos deixou em 2014. Teve a Luci Anna professora na pedagogia que era também a supervisora da EMEI que eu trabalhei por 26 anos, desde que entrei na rede municipal.

No dia 10 de outubro tivemos a notícia muito triste do falecimento de um professor muito querido na vida da minha filha, Belmiro Mendes de Castro professor Titular de Oceanografia no Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo, "peça" central na escolha dos futuros passos da minha filha na área profissional. Sempre temos professores (as) que nos fascinam na arte de ser mais apaixonados pela profissão, sempre temos alguém para nos identificarmos, aquela pessoa que faz a diferença quando estamos com dúvidas. Como minha filha mesmo disse e eu usarei suas palavras, "Só tenho a agradecer o que o senhor ensinou à ela, todas as oportunidades que deu, que confiou na suas capacidades", descanse em paz.

Nesse panorama, eu penso muito sobre tudo isso, tenho 30 anos de trabalho na profissão de professora,  me qualificando a cada ano com formações dentro e fora das escolas por onde passei, e nesse tempo todo quantas vidas passaram por mim, quantas crianças e jovens foram "tocados", de que formas, positivamente ou negativamente, porque não somos perfeitos (as). O quanto influenciamos a vida das pessoas, o quanto tocamos a vida do outro. Isso é importante falar, tomar consciência de toda a nossa responsabilidade de ser quem somos, de quem nos tornamos todos os dias. Hoje eu vejo que todas aquelas injustiças que eu vivi na escola, me levou a tornar-me profissional da educação na busca de fazer a diferença na sociedade das crianças que eu atendo até hoje, de construir parcialmente a formação de cada um deles; crianças, jovens e adultos. 

Sempre estamos escrevendo a história do país enquanto escrevemos a nossa história. Ser professora é o ponto de partida de um projeto de pesquisa, damos a oportunidade de dizer que não sabemos mas que podemos ajudar a questionar na busca do caminho e emprestamos a bússola para que o aluno possa mudar o trajeto. Enquanto o aluno procura dar seus passos, nós caminhamos juntos mesmo que cada uma siga o seu caminho em particular.

Nesse tempo de pandemia estamos nos reinventando, reescrevendo os fazeres da educação. Estão sendo inúmeros momentos de determinação, foco, formações, cansaço físico e emocional, adaptações, conhecimento, autoconhecimento, limitações, transformações, descobertas assim como nossa privilegiada profissão é e sempre será, de lutas e conquistas.

Profissionais da educação qualificados que somos, nunca saímos da escola, seja como aluna quanto como educadoras. Sou grata por cada professor que fez parte da minha história de aluna, sou grata por cada colega com quem trabalhei e trabalho, sou grata por cada aluno (a) e famílias que estiveram nesses anos profissionais, me ensinando a ser um ser humano melhor e mostrando minhas limitações.

Tem momentos que nos questionamos se estamos fazendo nosso melhor, se nossos passos estão no caminho certo quando nos deparamos com obstáculos, mas percebemos que as vezes a insatisfação não é nossa e sim do outro e que obstáculos são pertinentes para nosso crescimento e continuamos.

Nós professores (as) lutamos por dias melhores, pela permanência de direitos conquistados, por melhores condições de trabalho, pela valorização do profissional da educação. Somos educadores e trabalhamos com pessoas. Queremos pessoas melhores para o mundo que vivemos porque acreditamos no nosso trabalho de formiga, de elefante, de tsunami, de construtor. Pode parecer loucura ler tudo isso mas não é, meu trabalho é formar pessoas e aprender com elas, rir, brincar, descobrir, inventar, criar, reinventar, viajar numa história com e sem livros desenvolvendo as habilidades e potencialidades, no desenvolvimento integral de cada uma delas.

Ufa!! Não somos deuses mas somos professores (as)! Nosso dia é o 15 de outubro, mas todo dia é dia daquele que nos proporciona olhar um mundo de possibilidades! Parabéns a cada um nós que escreve a história da educação porque acredita nela e em si mesmo (a) . Para hoje não só o meu obrigada a todos que fizeram parte da minha trajetória mas àqueles que fazem parte hoje, amigos que conquistei, colegas que conheci, parceiras de trabalho do cotidiano em tempos de isolamento social. 

Somos educadores (as) feitos de sonhos, desejos e realizações, alimentados com música, poesia,  poemas e crenças. Todos os dias semeamos sementes em corações infantis e nos nossos corações de criança. Esse é o trabalho da educação, enfrentamos todas as estações do ano, dias bons e dias menos bons. 

Parabéns a cada um de nós por sermos professores (as) hoje e sempre!!

Imagem cedida pela assistente de diretor Fabiane na reunião online de hoje 14/10/2020


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